terça-feira, 7 de setembro de 2010

Interlúdio

O sol na cara cria um filtro meio Grains de beauté nos primeiros segundos do dia. Seu sorriso sincero afasta as nuvens do corredor. Afasta o mal. Afasta a dor. Passo a reconhecer os feirantes. Dou bom dia com os olhos, caminhando por um asfalto cheio de aromas. Já não brigo mais com meu despertador. De repente você me traz essa vontade de cuidar da minha saúde. Absurdo. Acho graça dos tapas que recebo na pele rabiscada. Acho graça da nossa vida. Nos meus braços, sem espaço, a tinta fica mais forte. Minha cor torna-se rubra e invade meu branco de sangue. Minha língua invade e traduz-se dentro de seu corpo. Ela fala sozinha. Você geme. O tempo corre lento: anda zombando da gente. E me pego falando sozinho. Desenhando corpos nus. Eles correm, tatuados, debochados. Sigo escrevendo. Protestando. Deixando meus livros caídos pelo quarto. Deixando a janela aberta. Tudo com esse filtro meio Grains de beauté. Tudo com essa música tocando pela milésima vez. Respiro forte. Fica fácil fazer poesia assim, com sua perna em cima da minha, louça suja na pia e aquele quadro triste e inacabado, pedindo atenção no outro canto do nosso quarto.

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