quarta-feira, 16 de abril de 2008

Por hora é só

Vamos fazer um pouco de música, falar besteira e queimar alguns papéis. Jogar fora tudo o que soa denso demais pra uma sexta feira à noite. Vamos dormir e desligar as preocupações sobre quem vai poder entrar ou não. Pelo menos vamos representar, vamos fingir. Chega de nervosismo por nada. Trocamos de amigos por uma semana e já pegamos um caminho diferente de volta pra casa. Ou nem voltamos. Paramos de ligar praquelas coisas que continuam insistindo enfiar em nossas cabeças, que nem são coisas assim tão válidas a ponto de se ligar. Um pouco de mp3, um pouco de distorção e uma garrafa de vinho. Algumas garrafas de vinho. Uma rede e uma imagem do cristo. Um monte de livros antigos. Coisas que possam fazer valer um pouco mais cada minuto que a gente passe junto. Pode gritar comigo ou arrumar mais uma dessas discussões ridículas pra nossa coleção. Ou pode ficar assim passiva pedindo um pouco mais de carinho com os olhos, enquanto procuro outra música no youtube. Pode sentir vergonha de alguns de meus textos antigos também, mas não peça minha permissão pra achar mais do que tesão e suor em tudo o que quero com você por hora. E por hora é só.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Soneto do início

A gente deixa a janela aberta
e convida os barulhos da rua pra dentro.
Entre sons de pneus amaciando pedra
e aquela orquestra feita de chuva,
que inclusive vem com cheiro bom,
nos entendemos bem.

Mais um filme que devolvemos sem ver,
mais uma tarde que a gente nem vê passar.
Fica mais fácil esperar o que nem sabemos se virá,
quando combinamos esquecer a época
em que esse tipo de coisa insistia em importar.

Agora somos nós sem medo do erro,
ou quase.
Sem pedidos de garantia,
vacilando inocentemente de propósito
só pra deixar tudo mais bonito.

E fica tudo menos fake,
são menos bandas novas pra se ouvir
e menos poses em dia de lua.

É sol e temos tempo de errar porque tudo é começo.
É dia e temos a semana pela frente porque tudo é começo.
Pega um pouco d’água e vem pra cá com essa tua risada leve.
Porque agora tudo é começo.

terça-feira, 8 de abril de 2008

14 tatuagens

Contei e ao todo eram 17 tatuagens. Olhava os detalhes e ainda assim não conseguia lembrar o que fazia no dia em que pintei meu destino com cada uma delas. Um cheiro de cerveja velha permanecia no ar, aquele lugar nunca tivera a chance de sentir outra forma de aroma. Um maldito som com uma batida grave e distorcida vinha e voltava com o vento pela janela. Estavam todos presos e eu ali naquele hotel. Estavam todos se fudendo e eu ali como um maldito relógio, esperando minha vez de ser trancafiado ou morto numa tentativa de fuga. Minha insegurança podia prever o futuro. Sempre achei astrologia coisa de charlatão, mas ali eu era capaz de prever friamente que erraria todos os tiros. Talvez com sorte, se mirasse no quadro do banheiro acertaria o peito do primeiro filho da puta que atravessasse aquela porta. Minto. Lembro-me sim da nona tatuagem. Era minha santa, minha protetora. Uma vez li numa dessas revistas metidas a explicar a história contemporânea, que essa característica de tatuar ícones religiosos era coisa de latinos. Eu não era latino. Era italiano. Era um merda de um italiano. Um italiano que não podia prever o futuro, mas podia enxergar minha mãe chorando ao lado de alguma janela em algum bairro do subúrbio. Esperando-me chegar, cheia de lágrimas nos olhos. Com aquele mesmo copo cheio de saliva seca e batom doce nas bordas. O mesmo uísque. O mesmo meio lexotan. Ela seria capaz de fazer qualquer coisa pra me tirar dali. Qualquer coisa.
Meu coração batia cada vez mais acelerado. Aquela música de gueto vinha e voltava com o vento. Contei novamente. Realmente eram 17 tatuagens. Cheguei ao hospital com 14. Meu braço ficou lá naquele quarto com cheiro de cerveja velha. Cheio de anéis e uma poça de sangue contida. Bela saraivada nos ombros aquele merda acertou. Não deu tempo nem de mirar na porra do quadro do banheiro.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Pelo calor

E se já sinto querer você
que nem sei direito quem é,
assim me sinto menor.
Mas assim mesmo me sinto vivo
quando percebo que minha outra história
não chegou ao fim,
só é hora de sair de mim.
Se o violão me traz àquela hora sem cor,

é por causa dessa sua roupa que nem entendo,
com seu jeito bem menos bonito.
Com esse céu cinza que não combina com o dia lindo
que fez quando li aqueles textos
ou te beijei errado na madrugada.
Nada combina.
Não combina a gente afastado assim,
como nunca combinou a gente fazendo planos juntos.
Não combina minha cabeça perceber
que nunca era pra ter sido.
Não combina você mais uma vez
dando desculpas esfarrapadas pra gente não ficar junto,
quando o que seria muito mais bonito de dizer,
você não diz.
Diga não, moça.
Diga nunca.
Viva o risco sem a vergonha.
Passe suas dúvidas pra mim
que transformo em poesia.
Ou sofro, sei lá.
Mas, não mais.
Não mais agora.
Na verdade não me passe mais nada.
Não me passe mais nada
se agora o que quero
é passar sem você.
Esse dia de chuva combina com o que sinto.

A carona combina com o que sinto.
Mais uma vez sem você num final de noite,
combina com a gente.
Às vezes acho que posso perceber
seus momentos de fraqueza e dúvida.
Mas agora quero você
como quem quer uma amiga.
Sei que agora ainda quero teu sexo,
mas é por esse calor que me faz escrever.
É por esse calor que me faz estar vivo.
É por esse calor que faz minhas chegadas
serem repletas de perguntas sem respostas.
É pelo calor que dá tanta sede.
Que me dá tanta fome de querer descobrir
sem me importar se vai dar certo ou não.
Assim como quis você.
Como eu quis te amar.
Como eu quis chorar no teu colo.
Como eu quis.
Mesmo sabendo que com você
não haveria sequer motivos pra chorar.
Mas agora quem chora não sou eu.
Agora são somente essas nuvens pretas
que deixam tudo mais bonito.
Agora é essa chuva.
Agora é esse céu chorando,
cobrando cada atitude minha
em cada trovoada.
Agora é outra amiga apaixonada que chega
e vejo como está bonita.
Vejo como seus olhos estão radiantes.
E isso é bom.
Mas aí percebo como você está estranha
com essa sua roupa que não entendo.
E percebo que você deu tanto valor
pras coisas que menos te deram coisas em troca.
E me dá uma vontade danada de te salvar.
Logo eu, tão perdido.
Então já quero ser seu amigo de novo
e esqueço esse papo raso de salvação.
Afinal quero te ver bem porque ainda te amo.
Quero te ver bem porque talvez no futuro
não consiga explicar metade das coisas
que agora escrevo sem esses freios tolos
que travam nossos erros.

Quero-te bem mulher.
Quero-te forte.
Mas agora te quero longe de mim.