quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Só pelo prazer de observar suas costas até a esquina

Gostava de olhar praquelas costas. Preferia seus vestidos, camisas ou o que quer que a moda resolvesse lhe presentear, com decotes. Generosos decotes nas costas. Vibrava com a possibilidade de aplicar uma de suas massagens, mesmo cansado pós drink, pós trabalho, só para ficar num estado erótico quase meditativo, olhos vidrados num caminhar suave pelos contornos, pele e geografia de seu derrière. Preferia todas as posições sexuais em que a mantivesse assim, numa espécie de nuca a tete. E seguia negligenciando por puro prazer, de forma muito natural, seus belos olhos, maças do rosto e sorriso estonteante. Seus dois círculos castanhos observavam continuamente um vazio a sua frente, enquanto o prazer vinha por trás. Ela se divertia com isso. Se divertia com cada uma das putarias que chegavam a seus ouvidos acompanhadas por seu hálito quente. Olhar nos olhos era permitido, geralmente o suficiente para que levasse um soco poético ou para que suas almas afastassem o mal que a falta de um amor faz para uma biografia. Páginas em aberto seguiam sendo escritas, guardadas, espalhadas pela casa. Os dias passavam lentamente só de birra, para abrir espaço pra noite perder-se entre horas mal dormidas. Pra quê dormir? Era preciso beber aquela indiferença pelo dia. Era preciso respirar a lucidez que transcende a importancia de uma agenda. Enquanto levantava para trabalhar, ela continuava na cama. Miava em dor, sucitando vontades de um pouco mais. Mas era preciso sair. Talvez só pela saudade. E enquanto caminhava com a barba por fazer pela rua de pedras, sentia os olhos dela, olhando pela janela, lá atrás. Quisera ele trocar suas posições. Quisera ele estar ainda no quarto e ela na rua. Fechava os olhos e imaginava isso em sonhos, só pelo prazer de observar suas costas desfilando até chegar a esquina.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

8,2 km

E leve respiro com meu nariz completamente descongestionado. Apaixonado, meu pulmão funciona bem. Tenho fôlego de criança e ando sem apego junto a tudo que faria uma falta danada senão estivesse tão despretensiosamente presente. Dou furos que de tão burros me aquecem como um banho de mar numa tarde nublada e fria. Sou absolvido em meus fracassos por cada sorriso seu. Por cada olhar que me fuzila cheio de amor, semi cerrado, cheio de tesão à flor da pele. Estou falando de mim, que encontrei meu caminho. Estou falando que posso andar para o lado, mas só vejo graça em descobrir mais o que nossa história pode dar. Estou falando. São claras as minhas pequenas contradições. Tão certas que me fornecem leveza. Me sinto em albergue, sem rotas, não preciso responder-te sim. Não deixo a coragem escapar, sigo forte em minhas idéias. Tenho suporte em cada passo, que se bem dado, encontra seu corpo ao lado encostado a mim. Nossa história já tão cheia de estórias segue simples, segue indo bem, meio assim. Tem seus pontos fortes, seus pontos fracos, mas não admite distâncias, então seguimos sem achar tudo tão fácil. Minha dança pede você, minha bailarina. Nossa cama não admite fim. Se te quero em fogo, te espero em pleno vento. Não preciso proteger meus olhos da poeira ou da sujeira do tempo, nem proteger tuas dores de mim. Você é minha e não há nada que possamos fazer. Em liberdade poderíamos ir embora a qualquer breve momento, mas não seria justo, nem, tolamente, ousaria isso significar um fim.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Notas de um mesmo assunto nº23

Se não escrevo mais já não posso ser considerado um escritor. Já não posso mais colocar em forma de pequenos retalhos, cada fiapo do que sinto descrito em palavras. Tenho medo do que escrevo. Prefiro dizer. Prefiro sentir. Queimo a língua e coloco fogo em todos meus livros. Em todas as minhas páginas com cheiro de loja. Minhas letras são feitas de chuva. Preciso de mais lama pra limpar cada página em branco com a sujeira que emociona e faz tudo começar a criar sentido. Se você me lê e pensa consigo "Nossa! Como entendo isso?!", já não faz o menor sentido que ainda sim, eu siga sendo entendido. Compro cada metro que nos separa e pago caro por isso. Peço por minhas certezas o mínimo, para que elas não sejam motivos de piada. Motivos de orgulho, eu já garanto quando levanto da cama e nos primeiros raios de sol percebo que não penso como você. Me afasto dessa retórica rouca. Sigo longe dessa receita de bolo indefectível. Você é pouco para mim, é apenas sobremesa. Sou mais forte por saber rir, por saber perdoar e por pensar que se consigo ser o inverso do que você acha que o sucesso é, já encontrei metade dos meus objetivos do dia.